As rádios emitem em várias frequências. Estes episódios, contudo, situam-se numa frequência diferente, não uma de rádio, mas de radio. Como em Radioterapia. Episódios de um tratamento oncológico (à suivre)
Quinta-feira, 28 de Junho de 2012

Lambard: "Não salte muito, que o osso está em risco de fractura. O melhor é andar de muletas."

Eu: "Errr... Não salto muito?! Há 5 dias atrás estive 3h a saltar num concerto punk... e agora tenho que andar de muletas?!"

 

 

 

 

 

" I live to watch you fail,
I live to watch you fail, I live to watch you fail,
I am the wind in your sail


I wish you the worst dear, to feel the greatest pain
'cause i'm right here,
to retrieve all you stole every tear,
and everything you own i wish you hours of madness,
years of dysfunction, the deepest embitterment "

 

 


Quarta-feira, 27 de Junho de 2012

[Anteontem]

 

O meu corpo parece um campo de minas; ao mesmo tempo que nos desviamos de uma já esta outra debaixo dos pés pronta a explodir. Estou a ser comida viva. Cada cm3 do meu corpo pode esconder mais um revés. É iminente. Estou em estado de alerta máximo.

 

 

[Hoje]

 

é oficial, está por todo o lado. Ossos, gânglios, tecidos moles, músculo. Ainda não fiz exames ao cérebro. Sintomas, quase nenhuns, tirando uma dor no joelho.

 

 

[Sexta-feira, dia 29/06]

 

Continua a minha transformação em Robocop. Vou ser operada à perna. Vão-me pôr um tubo e uns parafusos no fémur. Impressionante, mas não é assim tão complexo... (até punha aqui um vídeo do youtube, mas fica para outro dia!)

 

 

[Depois...]

 

Depois vem aí mais radio, e também quimio. Estou lúcida e anestesiada. Vou demorar algum tempo a processar isto tudo. A tentar desesperadamente manter a cabeça à tona de água. Que está fria, muito fria, pior do que no Titanic.


Terça-feira, 26 de Junho de 2012

publicado por Silvina às 14:52

Segunda-feira, 25 de Junho de 2012

Acordo às 9h30, reparo pela dor de cabeça que me assiste que afinal só tinha dormido 4h30. Ligo ao meu amigo, desmarco o encontro, rebolo-me na cama e tento dormir. Às 11h consigo adormecer e ao 12h levanto-me. É domingo. Ligo o computador e por acaso dou de caras com a noticia que dali a 4h o meu chéri Ibrahim Maalouf ia dar um concerto em Paris. Incrédula, desafio o meu amigo para me acompanhar. Ele: "Mas olha que vai chover." Eu: "Não vai nada. E aquilo é num parque, mas é coberto." Ele: "Tens a certeza?" Eu: "Tenho. É o Ibrahim. EU VOU."

 

 

 

 

Fui.

 

Já não apanhava uma molha assim há muitos anos. Foi até ao osso...


Sexta-feira, 22 de Junho de 2012

Pois é, fiz 30 há uns dias. Sempre pensei como seria este momento, como estaria na minha vida, como é que me ia sentir... Velha, gasta e decrépita ou cheia daquela maturidade e equilíbrio zen que ouvia dizer que se adquiriam com os 30?

 

Pegando no mote dos 30, vou pela primeira vez pôr aqui um "Selo", só porque vem do blog da EU. Não costumo achar piada a selinhos, mas sigo a EU há muito tempo (e ela a mim), e pronto, se ela gosta de selos e inventou um, eu alinho.

 

Então cá vai disto:

 

  

- a) Como sonho ser quando tiver 30? ou Como era eu com 30 anos? (consoante a idade de quem responde).

 

Tenho 30 e quero ser o mais parecida comigo que conseguir.

 


 - b) Quais as vantagens e as desvantagens de se ser trintona? (Pelo menos 2 vantagens e 2 desvantagens, mas podem escolher mais, se quiserem).

 

Vantagens: maturidade, e no meu caso, foi uma pequena vitoria pessoal ter chegado aos 30;

Desvantagens: ligeira cedência às leis da gravidade no que a mamas diz respeito; e também sinto uma ligeira pressão social do género: aos 30 devia ter emprego, marido e casa e não tenho nada disso. Mas isto na volta é mais uma incerteza do que propriamente uma desvantagem. Ah, outra vantagem, a liberdade de se mudar de vida e cagar nestas incertezas/ desvantagens/ pressões sociais, porque lá está, aos 30 somos maduros e assumimos as nossas escolhas da vida. Olha que porra, e agora misturei vantagens e desvantagens (não tenho mesmo jeito para selinhos).

 


 - c) Que sonhos me falta realizar? (Pode ser o número de sonhos que entenderem).

 

Ui, esta dava pano para mangas. é difícil responder, porque os meus sonhos estão sempre a mudar (Ah, cancro, a quanto obrigas!). Mas assim por alto: viajar mais, mudar de carreira, estudar muito e nunca estagnar, aprender sempre!

 

 

Para roubarem o selinho, espreitar o blog da EU, ou tentar a sorte num passatempo que ela também inventou, sigam este link:

http://acasados30.blogspot.fr/2012/06/pois-entao-inventei-um-selinho.html

 



Se de inicio tinha uma enorme dificuldade em associar a palavra morte à palavra cancro, agora já me deixei disso. Fervo por dentro quando leio que alguém morreu de doença prolongada. Fico fora de mim quando se impedem doentes de falar da morte, como se falar disso a trouxesse mais depressa, como se fosse um mau olhado, um chega-essa-boca-pra-lá senão ela vem aí.

 

Há cancro e há morte. Há gente que morre de cancro, e que infelizmente vai ter que viver essa experiência -morrer de cancro. 

 

Falar do medo da morte não arranca a esperança, nem a fé num final feliz. Exprimir o medo da morte é vital, e isso deveria poder ser feito sem papas na língua e sem gente a correr para pôr a mordaça ("ai, não digas isso, não fales assim").

 

Só tem medo de morrer quem ama a vida. E se ama a vida, vai querer viver. Vai lutar, vai fazer os possíveis para viver com o cancro, almejando viver sem ele um dia. O cancro é só uma doença. E hoje acredito mesmo que falar dele, e de tudo o que ele abarca, é essencial. E isso inclui exprimir emoções mais difíceis, como por ex: o medo dos tratamentos, da queda de cabelo, da solidão, das dores, das cirurgias, do futuro em cheque, e o medo da morte.

 

é preciso falar do cancro enquanto experiência que faz parte da vida. Que a integra, que a constitui durante um determinado tempo e que vai afectar toda a gente à nossa volta. é avassalador, mas também pode ser um momento propicio a descobertas, ao intensificar das sensações, ao aproveitar melhor a vida e dar o devido valor às coisas que nos importam na vida.

 

Não há dia em que não pense na morte, no medo de morrer de cancro. Mas também não há dia em que não pense "hoje estou viva."

publicado por Silvina às 19:37


Descobri há dias uma nova série da BBC, True Love. São cinco episódios entre 25min a 30min, que contam historias de amor. São amores que vão, amores que vêm, que se escondem, que reaparecem, amores que se criam ou destroem nas distâncias e nos silêncios, e acima de tudo, a série fala das escolhas que fazemos por Amor. 

 

Gostei imenso do episódio 4, porque mostra que o amor também (ou sobretudo) proporciona a descoberta de nós próprios e permite uma libertação incrível. é a esse tipo de amor que aspiro, aquele que liberta, e não aquele que prende.

 

 

 

"good thing happen, sometimes"

 

 

E hoje não me escapa o episódio 5, com o meu chéri David Morrissey (por falar em amor, unia-me já factualmente com ele sem pensar duas vezes).

publicado por Silvina às 15:12
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[é por estas e por outras que acho a Tailândia um país fantástico.]


Segunda-feira, 18 de Junho de 2012

Entrevista de Naide Gomes à revista Visão, sobre a sua carreira:

 

 

 

" ... Na pista, mesmo nos treinos, Naide perde o sorriso. E o seu olhar ganha intensidade, quando se concentra nos exercícios de corrida ou tenta apurar o momento decisivo do salto. "Agora, só espero que as lesões me deixem lutar pelo meu sonho, porque vou mesmo lutar por uma medalha nos Jogos Olímpicos."

 

Poucos dias depois dessa conversa, chegou a desilusão. No sábado, 9, na corrida para mais uma prova de salto em comprimento, o seu pé não resistiu. Anos e anos de esforço voltaram a pagar fatura. Rutura do tendão-de-aquiles - chegou, rápido, o diagnóstico. E depressa se tomaram decisões: operação cirúrgica para resolver clinicamente a lesão e o fim do sonho olímpico, em termos desportivos. Aos 32 anos, Naide Gomes confessou, poucas horas após o infortúnio, estar "de rastos". Mas, logo a seguir, usou a sua página do Facebook, para anunciar que promete "nunca desistir". (...)"

 

Artigo completo AQUI.

publicado por Silvina às 13:26


Visão.pt

Não morri

Se tivesse morrido nesse dia, faltava uma grande quantidade de acontecimentos enormes na minha vida
José Luís Peixoto
hoje às 10:40
 

Não tenho memória, pequena ou grande, do momento em que decidi levantar-me da toalha. Estaria talvez a prestar atenção a qualquer outro pensamento, mas levantei-me da toalha e, de certeza, caminhei até à água. A minha memória começa no momento em que estava com água pelos joelhos.

 

Ao longo da minha vida, tenho estado em muitas praias, poucas de beleza mais extravagante do que aquela. Natureza a encontrar-se com natureza. De um lado, a natureza-água, mar com a cor certa, a temperatura certa, horizonte lá longe, no limite; do outro lado, a natureza-terra, areia limpa, dunas, sons comparáveis ao silêncio; por cima, a natureza-céu e, já se sabe, céu é céu, justo. Eu e o Milagre éramos as únicas pessoas em toda a praia. As únicas pegadas na areia eram nossas.

 

Quando me levantei da toalha, devo ter-lhe perguntado se queria vir. Se o fiz, ele deve ter respondido que não. Especulo porque, como disse, a minha memória começa já com água pelos joelhos. Depois, sem dar um passo, ainda a ambientar-me, já tinha a água pela cintura. Depois, sem me mexer, chegava-me à barriga, ao peito, aos ombros e, de repente, não tinha pé e estava a nadar o mais depressa que podia contra a corrente que continuava a levar-me para longe da areia.

 

Na minha família, faço parte da primeira geração que aprendeu a nadar. Nunca fui grande nadador. Aprendi tardiamente num tanque de rega que me chegava à barriga quando estava cheio e que acabava após duas braçadas. Nunca fui capaz de deitar-me de costas e boiar, ainda não sou. Invariavelmente, as pernas começam a afundar-se e, com elas, o corpo inteiro. Por isso, naquele dia, enquanto nadava contra a corrente, desconfiava das minhas capacidades. Sem estilo, quando me esforçava ao máximo, conseguia não me afastar durante um instante; mas eu não era capaz de aguentar o máximo do meu esforço por muito tempo. O mar tinha decidido que me queria.

 

Quando deixei de saber o que fazer, comecei a gritar. À distância, o Milagre continuava na sua pausa, impávido, deitado na toalha. A corrente anulava-me o esforço e as ondas anulavam-me os gritos ao lançarem-se sobre a areia. Então, chegou o momento em que aceitei o que me estava a acontecer. Pensei: que inglório. Eu estava a nadar com toda a força, mas esse foi um momento de grande serenidade, em que pensei: que inglório, tanta coisa para isto, tantas preocupações, tantos sacrifícios, tantas ilusões para isto. E senti o quanto era ridículo e vão aquele que eu julgava ser. Afinal, não era tudo o que imaginava. Afinal, era apenas um sopro. E senti uma pena profunda por desaparecer o amor que sentia por aqueles que nunca mais voltaria ver, a minha família, de quem não me tinha despedido e a quem daria um desgosto enorme. Que triste e inglório. Aquela ida à praia, simples e inconsciente, iria definir-me para sempre. Aquele momento podia ter sido evitado de tantas formas mas, ali, já não podia ser evitado, era real. Eu ia morrer.

 

Eu ia morrer? Perante essa certeza, como nos filmes, já sem pensar, nadei o mais que pude, para lá da exaustão, a ignorar a exaustão e o corpo. Não sei como, mas houve uma trégua na corrente, talvez o mar se tenha comovido com o meu esforço, e consegui avançar. Cheguei à areia, como um náufrago, a cambalear e fiquei deitado de costas durante muito tempo, até conseguir recuperar o fôlego.

 

Foi há doze anos. Muitas vezes, parece-me que este tempo desde então é um bónus. Se tivesse morrido nesse dia, faltava uma grande quantidade de acontecimentos enormes na minha vida. Não vou enumerá-los. Agora, aqui, seriam como montanhas e basta-me a sua sombra para me embargar a voz.

 

Conheço pessoas que morreram. Ao contrário de mim, morreram mesmo. Todos os dias passa tempo que não é testemunhado por elas. Os seus olhares ficaram parados numa data que se afasta cada vez mais. Nós, que conhecemos essa pessoas, que partilhámos um tempo que continha a sua presença, estamos aqui e podemos avaliar o tamanho da sua falta. Assim, da mesma maneira, devíamos ser capazes de perceber toda a dimensão disto: o nosso nome ainda nos pertence, temos planos banais para amanhã.

 

Quando cheguei à toalha, ressuscitado ou renascido, expliquei ao Milagre o que acontecera. Ele continuou a olhar para mim com a mesma expressão e, depois de algumas frases, mudou de assunto.

publicado por Silvina às 13:13


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