As rádios emitem em várias frequências. Estes episódios, contudo, situam-se numa frequência diferente, não uma de rádio, mas de radio. Como em Radioterapia. Episódios de um tratamento oncológico (à suivre)
Quinta-feira, 30 de Dezembro de 2010

Entretanto já fiz as primeiras 2 sessões de radio.Correram bem. O inicio é sempre muito fácil.

Counting down:

 

33

32

31

30

29

...

publicado por Silvina às 19:08


Desci à cave para fazer a "mise en place" da radio. Este exame, que demora entre 30 a 45 minutos, serve para avaliar se todos os pontos e medidas estão marcados correctamente, se a máscara está no sitio, e outros pormenores técnicos que não fixei. Ando a ficar cansada de fixar tudo. Não tenho ideia de quanto tempo demorou, porque adormeci a meio. é a minha técnica para controlar o horror de estar fechada dentro da máscara, imóvel. Entro em zen, respiro, começo a meditar e invariavelmente acabo por adormecer...

 

Dormi uma noite mais ou menos tranquila. A cabeça a mil, com todos os problemas da vida misturados, mais o receio da quimio. Será que vou vomitar-me toda? Será que vou ter náuseas como aquelas que tive quando fui operada?

 

No dia seguinte acordaram-me às 8h, tive meia hora para efectuar a minha higiene de gata e depois puseram-me a perfusão. No meu caso o Lambard decidiu não por cateter e utilizar directamente a veia. Depois do enfermeiro me ter assustado com o discurso do "se não encontrar veia vou ter que a picar muitas vezes", acertou à primeira. Toma, que estas veias são uma maravilha, estão sempre prontas para o chuto! Estive a soro durante muitas horas, durante as quais era suposto ir à casa-de-banho encher um frasco de 1l cheio de mijo para me controlarem as urinas. Lá andei o dia todo com o "cabide" das perfusões atrás, a ir à WC encher frascos (enchi 2!). Estes rins também são abençoados, pelos vistos. Tudo ok, às 16h começa a quimio. Nem dei por ela. A M. ainda me perguntou: "Estás bem? Dói-te a cabeça?" E eu: "Um bocadinho, não sei porquê..." (porque já estava a levar com ela, óbvio!). A ignorância às vezes é uma grande vantagem. A quimio em si durou 1h. Depois continuei a soro até ao dia seguinte de manhã.

 

No fim da quimio só pensava: "Então? quando é que começa o festival do vomito? Estou pronta!". Mas até hoje, nada. Estou à espera, sentada, e preparada com o alguidar novo todo jeitoso que a M. me comprou, e que está ali apostos* a postos, ao lado da cama. Se não servir para o vomito vai servir para lavar roupa à mão...

 

 

*Ando em drama com esta palavra. Acho que se diz e que se escreve assim mas não a consigo encontrar em nenhum dicionário. Mistérios da gramática portuguesa? Adenda: já fui esclarecida. Thanks M.!

publicado por Silvina às 18:52


Fui internada dia 28 à tarde. Cheguei, instalei-me e conheci a minha vizinha de quarto, uma senhora de 60 a poucos anos, baixinha, (muito) magrinha, que estava lá também para fazer quimio. Já vai no seu 3° cancro. O primeiro, aos 33 anos, levou-lhe o útero e deixou-lhe uma cicatriz enorme na barriga, como por gestos me demonstrou. O segundo cancro, em 2004, atacou-lhe o osso da cara, mesmo por baixo do olho. A radioterapia deixou-a meia surda e a ver mal e destruiu-lhe a mucosa da boca, e por essa razão só come líquidos há 3 anos. Agora tem um linfoma. São três cancros distintos, que como leões esfomeados que insistem em lhe devorar o corpo fragilizado. Com um ar triste, um encolher de ombros e um ligeiro suspiro explica-me que o seu pai, mãe e alguns tios morreram de cancro. Que tem 4 irmãos e até hoje nenhum ficou doente. Foram todos para ela. O cancro tornou-se o seu destino, e do alto do seu corpo enfezado anda a resistir-lhe há mais de 30 anos.

publicado por Silvina às 18:25


Cuidar da imagem é uma arma

A beleza dá-me força para lutar contra o cancro

29.12.2010 - 15:38 Por Graça Barbosa Ribeiro

 

Faz sentido que alguém com cancro se preocupe com o cabelo, com a pele ou com o estado das unhas? Faz. Os estudos científicos vêm confirmar aquilo que há muito as mulheres descobriram por si próprias - a beleza é fundamental. E no Centro de Aconselhamento Estético do Movimento Vencer e Viver aprende-se a cuidar dela.

 

ARTIGO COMPLETO: http://publico.pt/1472943

publicado por Silvina às 16:36

Segunda-feira, 27 de Dezembro de 2010

Ultimamente ando a tentar informar-me melhor sobre a minha doença. E descobri este livro/guia do paciente:

Patients' Guide to Head and Neck Cancer (2010)

 

 

 

é mesmo muito bom e recomendo. Pode ser comprado neste site: http://www.bookdepository.co.uk/book/9780763774318/Head-and-Neck-Cancer

(com portes grátis para Portugal)



Estava previsto começar hoje uma nova etapa. Mas a máquina avariou-se, porque as máquinas também se avariam e, apesar do meu enobrecimento do sistema nacional de saúde francês, este, às vezes, também falha.

 

Fica para amanhã então. Ainda falei ao telefone com o Lambard. Disse-lhe que estava bem, mas que queria ver uma psicóloga. Que já tinha recorrido a uma de outro serviço (leia-se, de outro hospital parisiense) mas que não tinha gostado. Disse-lhe que sou uma pessoa difícil e exigente. E ele respondeu que tratava disso, que agora eu estava a seu cargo. Foi bom ouvir esta responsabilização pelo meu bem-estar. Gostei.

 

Anyway, será depois de amanhã que me estrearei nas lides da quimioterapia, com radio ao mesmo tempo. Devia mudar temporariamente o nome do blog para 33 episódios de radio e 3 de quimio. Tenho medo. O Lambard diz-me que não me vai cair o cabelo, mas que os principais efeitos secundários desta quimio que ele chama CDDP (?!) são vómitos e náuseas. Ora bem, eu sou uma pessoa sensível ao vómito. Logo aí sinto por isso uma certa apreensão. Juntando a isso o pequeno pormenor de ter que ficar hospitalizada durante 24 a 48h para controlarem o meu estado. Estou ligeiramente nervosa. Eu, Silvina, assumo no presente post ter cagaço da quimio.



Já não é a primeira nem a segunda vez que oiço de várias pessoas amigas a frase: "desculpa, mas eu não sou forte como tu." como desculpa por uma distância que julgam necessária, e um afastamento que julgam o melhor a fazer. Eu sei que não são fortes como eu. Porque não são eles que têm cancro; porque senão seriam tão fortes como eu. Porque o cancro não oferece escolha. Ou se é forte e se luta, ou (e a alternativa não é agradável) se deixa ir abaixo e eventualmente se perde a batalha.

 

Quando soube que tinha cancro e percebi que tinha de me encher de coragem para enfrentar isto agarrei-me a tudo o que fazia sentido na minha vida. Recorri a todos os pontos positivos do meu ser, à amizade dos meus amigos, ao carinho e ajuda material da família, agarrei tudo o que podia. Concentrei em mim uma explosão de energia, uma espiral de good vibes e pensamentos positivos. Era a única forma de continuar a viver, a tratar de mim, de cabeça erguida. E fiz isto por mim, mas também pelas pessoas que estão à minha volta. Porque elas também merecem que eu lute, que estrebuche, que me sacuda, que não me deixe ir abaixo, que não seja vencida por este cancro. Eu importo, mas os outros também. E é ai que vou buscar a minha força, que não me é toda inata: a força trabalha-se, empresta-se, ganha-se, cultiva-se.

publicado por Silvina às 17:42
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A ler e a imprimir, mesmo para quem não pesca nada de francês, é muito facil de ler e tem muitas imagens. Para guardar à mão de semear nas vossas cozinhas.

 

http://www.anti-cancer.fr/docs/reflexes-anticancer-quotidien.pdf

publicado por Silvina às 17:39

Terça-feira, 14 de Dezembro de 2010

- Não lavo o cabelo há uma semana;

- Tenho um buço que desafia qualquer peixeira do mercado do Bulhão;

- Tenho pêlos no pescoço, na zona do enxerto de pele (porque a pele veio da perna, logo tenho pêlos da perna no pescoço);

- Nem vou referir os pêlos no sovaco;

- Não lavo a perna esquerda há mais de um mês;

- Não tomo banho desde o dia 7 de Novembro de 2010 (lavar-me à gata não conta);

- Os dentes também não estão no seu melhor (como a boca não abre quase nada e as gengivas estão hiper-sensíveis, a lavagem eficaz dos dentes fica condicionada...);

- Acho que tenho mau hálito, mas ao menos já não me babo tanto de noite;

 

E nunca ninguém no hospital nos avisa destes pequenos pormenores tão importantes na vida de uma gaja...

 



E por falar em visitas, esperam-me 4 dias maravilhosos de romance. Depois, se estiver inspirada, talvez faça um post que gire à volta de tópicos como:

 

cancro - pós-operatório - sexualidade - lidar com um corpo doente - amor.

publicado por Silvina às 14:18


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