As rádios emitem em várias frequências. Estes episódios, contudo, situam-se numa frequência diferente, não uma de rádio, mas de radio. Como em Radioterapia. Episódios de um tratamento oncológico (à suivre)
Terça-feira, 13 de Novembro de 2012

E quando escrevo "14a" dá-me vontade de rir, do ridículo da coisa. 14 cirurgias. A nona com anestesia geral. A quinta com entubação pelo nariz. E rio-me porque ultrapassei tudo isto, nem sei bem como, parece que nem fui eu, mas fui.

 

Depois da quimio e das borbulhas andava cansada, cada vez mais cansada. Já sabia que era o coração a fazer das suas. Estava à espera que os sintomas piorassem para ir para o hospital. Ficou tudo ao meu critério e gosto disso. Gosto de poder escutar o meu corpo e decidir. Gosto de saber, de sentir como estou, de ter a certeza absoluta. Domingo pensei "pronto, não aguento mais isto. Amanhã vou para o hospital." E fui. E cheguei lá à tarde, e três horas depois estava no bloco operatório porque o meu coração não podia esperar, porque estava em esforço, em risco de vida. Pisei a linha da urgência. Retiraram-me outra vez 1,5l de liquido. "Porra, que este coração é uma garrafa de água...", pensei.

E pela primeira vez nem me fui ver ao espelho para espreitar a nova cicatriz. Recebi-a no meu corpo com aquele encolher de ombros, aquele "ékkk, é mais uma".

 

Tive um dreno durante uns dias enfiado na mama esquerda. Quando o retiraram a mama inchou. Fiquei com uma mama gigante e tive que andar a mostrá-la a vários médicos e enfermeiras. Em cardiologia mostra-se as mamas a meio mundo. Todos os estudantes me viram as mamas, o que antes me perturbava um bocado porque sou envergonhada, mas agora não me importo. Para eles sou só um corpo, e o que interessa é o que está por baixo da mama. Hoje já desinchou graças ao senhor, não me apetecia andar a mostrar ao Dr Lambard uma mama à la Ana Malhoa.

 

E estranhamente não tive muitas dores. Pedi morfina nas alturas certas, depois um bocadito de paracetamol e mais nada. Elevo-me para além da dor, de sempre a ter comigo esqueço-me que ela existe.

 

Saí do hospital antes do tempo, porque andava a delirar com sushi e gelado, e tive que vir para casa encomendar sushi e comer gelado como se não houvesse amanhã. Estou outra vez em regime de engorda. Como os gansos e patos para o foie gras (mas sem a parte cruel e nojenta de gavage).

 



Djavan - Nem um dia

 

 

 

...toda fragilidade incide...

publicado por Silvina às 10:50

Segunda-feira, 12 de Novembro de 2012

"Cada cicatriz conta uma história. Qual é a tua?"

 

 

Tenho tantas. Segunda-feira passada arranjei mais uma. Depois conto.

 

[E amanhã é dia de quimio!]

 

imagem via ihadcancer.com



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