Fui rugir para a Bretanha, pés ligeiros e coração ao alto, cheirei a maresia até se me revoltarem as tripas com saudades do mar de quando eu era pequena. Apanhei um escaldão na careca. Senti-me mal, sozinha, num quarto de hotel, e mandei calar as náuseas e a vontade de vomitar com um "bebe água e dorme que isso passa, amanhã vai ser melhor" (e foi). Tive medo de ir ao Monte Saint-Michel, medo que as pernas não me segurassem e que o equilíbrio me faltasse. Não fui, fica para a próxima. Hoje escolho melhor as batalhas e os desafios. Voltei para casa de TGV. Na gare apanhei um táxi, porque tinha a cabeça a andar à roda do cansaço (e do coração já a afogar-se). A primeira coisa que o taxista me perguntou foi: "está doente?" E eu: "Sim" E ele: "Constipada?" E eu: "Não, cancro." Continuo brutinha graças a Deus. Isso não o impediu de passar o resto do caminho à conversa, e de lá pelo meio me perguntar se eu era casada, e de me perguntar se não queria sair com ele. E eu, brutinha mas educada, disse que não, que tinha cancro, que era grave, que podia morrer, não sabia quanto tempo é que tinha, e que por isso não seria muito interessante para ele começar uma relação comigo. E o gajo cala-me com esta: "Estás viva. Não te vais agora enfiar na cama e chamar a morte. Estás viva. Tens de sair, divertir-te, conhecer gente, fazer amor..." Nessa noite estava demasiado cansada para avanços, mas gostei da ideologia. Acho que foi mais uma mensagem subliminar do Universo, para mim, através da boca de um magrebino (Allah bless, povo mais porreiro que não tem problemas com doenças nem medo do cancro).